O Consórcio Intermunicipal das Bacias dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí (Consórcio PCJ) reiniciou nessa quarta-feira, dia 14 de abril, as discussões sobre a renovação da outorga do Sistema Cantareira, com a realização de encontro técnico do Grupo de Eventos Extremos da entidade. A reunião contou com depoimentos de representantes dos setores agrícola, industrial e serviços de abastecimento sobre a situação hídrica atual, além de ter a participação do Professor Doutor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Antônio Carlos Zuffo, que explanou sobre a situação atual dos reservatórios e apontou que o Estado de São Paulo poderá passar por nova estiagem tão severa quanto a do ano passado ou pior de 2022 a 2025. Segundo ele, é necessário que os órgãos gestores se preparem para essa ocorrência climática.
A revelação de Zuffo faz parte do início da atualização do Estudo sobre as disponibilidades hídricas do convênio que o Consórcio PCJ possui com a Unicamp, que incluirá as ocorrências climáticas dos anos de 2014 e 2015, para balizar as propostas da entidade para a renovação da outorga do Cantareira.
“As próximas três ou quatro décadas poderão ter precipitações menores, devido ao ciclo do clima. Ora temos épocas mais chuvosas, ora com chuvas abaixo da média. A renovação da outorga do Sistema Cantareira, como também os Planos de Bacias, deverá prever ações de gestão para eventos extremos, sejam eles de cheias intensas como de secas severas”, comentou Zuffo.
O pesquisador da Unicamp ainda indagou aos presentes de que forma a região quer estar em 2022 diante de uma possível severa estiagem. “Como chegaremos a 2022? Vamos sofrer menos com a disponibilidade hídrica ou teremos os mesmos problemas que em 2014, senão piores”, disse ele.
Zuffo e sua equipe da Unicamp estão estudando a possibilidade de adoção de uma regra operativa variável do Sistema Cantareira em função de um ciclo chuvoso ou seco, na qual as retiradas dos reservatórios seriam determinadas pelo nível do Sistema Equivalente (a média dos quatro reservatórios que estão nas Bacias PCJ). O pesquisador sugere ainda, que além das Curvas de Aversão ao Risco (CAR), previstas na outorga de 2004, sejam instituídas as Curvas de Aversão às Enchentes (CAE), para garantir maior segurança hídrica diante do comportamento climático verificado na série histórica, alternando em ciclos de estiagens e cheias. As curvas de aversão ao risco serão estudadas e simuladas de acordo com a ocorrência climática de 2014 e 2015, o que poderá alterar alguns parâmetros na gestão do Cantareira para a nova outorga.
“O sistema de gestão foi fundamentado tendo como base o pior evento climático da série histórica, que foram os anos de 1953 e 1954. O biênio 2014 e 2015 têm grandes chances de ser pior que a seca da década de 1950, o que afetará o cálculo das curvas de aversão ao risco”, explicou Zuffo a uma plateia de mais de 30 representantes de empresas e municípios associados, e de serviços de abastecimento.
Segundo estudos realizados pelo professor com dados até 2013, o Sistema Cantareira não regulariza os 36 m³/s, previstos pela portaria DAEE 1213/2004, mas, somente 34,4 m³/s, o que seria um argumento técnico para inviabilizar, definitivamente, a ferramenta Banco de Águas, conforme estabelecida na portaria de 2004.
Não faltou planejamento, faltaram recursos financeiros
O vice-presidente de Educação Ambiental do Consórcio PCJ e prefeito de Pedreira (SP), Carlos Evandro Pollo, conduziu a reunião em nome do presidente da entidade, Reinaldo Nogueira, e atentou para a preocupação que os municípios têm quanto à disponibilidade hídrica do Cantareira. “Eu sou de um município no qual o Rio Jaguari cruza a cidade e sofre influência direta do Sistema Cantareira. As discussões que se realizam aqui no Consórcio refletem diretamente na água que corta meu município”, comentou ele, durante a abertura dos trabalhos.
O secretário executivo do Consórcio PCJ, Francisco Lahóz, explanou sobre a história do Cantareira e atentou que não faltou planejamento na área de gestão de recursos hídricos, mas sim recursos para a execução das obras. “A Sabesp havia um planejamento para quando o Cantareira chegasse ao ano 2000 buscar novas fontes de abastecimento no Vale do Ribeira, entre outras. No entanto, a crise econômica, originada em 1982 com a ida do Brasil ao Fundo Monetário Interacional (FMI) e suspensão automática de financiamentos internacionais, o que ocasionou a revisão desses investimentos e com soluções por meio de medidas paliativas. Não faltou planejamento, faltou recursos financeiros”, disse.
Setores apresentaram o que estão fazendo diante da crise hídrica
O Consórcio PCJ aproveitou a ocasião para convidar representantes dos setores agrícola, industrial e de abastecimento urbano para fazerem depoimentos sobre as ações de contingenciamento que estão sendo realizadas em face da crise hídrica.
O primeiro a se manifestar foi o vice-presidente do Programa de Proteção aos Mananciais do Consórcio PCJ e representante da Sabesp, Helio Figueiredo, que apresentou os resultados da aplicação do Bônus e do Ônus nas contas de água. Segundo ele, 73,34% domicílios na Grande São Paulo tiveram acesso a descontos na conta de água devido à economia. Nos municípios operados pela Sabesp nas Bacias PCJ esse percentual foi de 69,12%.
De acordo com Figueiredo, 10,31% dos domicílios da Grande São Paulo e 13,96% dos localizados nas Bacias PCJ tiveram aplicação de ônus nas contas de água devido ao aumento do consumo.
Essa iniciativa da Sabesp propiciou que o consumo de água por habitante por dia da Região Metropolitana de São Paulo caísse de 163 litros/habitante/dia para uma média e 143 litros/habitante/dia no ano de 2014, sendo que em 2015, essa média caiu ainda mais passando para 123 litros/habitante/dia.
A aplicação do Bônus e Ônus da água não é a principal ferramenta da Sabesp para racionalização do consumo. Figueiredo destacou ainda, o combate às perdas hídricas que prevê investimentos de R$ 3 bilhões de reais até 2020, o reuso de água como o do Projeto Aquapolo no ABC paulista (parceria entre Sabesp e Odebrecht Ambiental), as campanhas na mídia para sensibilização da comunidade, além do PURA (Programa de Uso Racional de Água), que já atendeu 2.500 imóveis do setor público com a troca de equipamentos inteligentes de consumo de água, permitindo a redução do consumo de 10 a 60%.
A superintendente do SAAE Atibaia (SP), Fabiane Santiago, destacou o bônus concedido na cidade, que durou seis meses e exigiu investimentos de R$ 3 milhões e gerou uma redução de 20% do consumo de água na comunidade de Atibaia. “Temos de aprender a reinventar a companhia com menos dinheiro”, comentou ela.
Fabiane pontuou ainda sobre o projeto de substituição de equipamentos inteligentes no consumo de água em prédios públicos, que conta com o apoio do Consórcio PCJ por meio do projeto “Construindo Sustentabilidade”.
Setor Rural tem investido em modernização da irrigação e em construção de reservatórios
Representando o setor rural estiveram presentes o vice-prefeito de Atibaia, Mario Inui, e o presidente da Câmara de Holambra, Petrus Weel. Inui destacou que os produtores rurais estão construindo reservatórios e bacias de contenção e modernizando sua irrigação por meio de gotejamento. “90% do nosso sistema de irrigação é por gotejamento, o que permitiu uma redução de 15 a 20% do consumo de água dos produtores”.
Weel destacou os reservatórios de armazenamento de água de chuva e de reuso que os produtores de Holambra possuem e estão construindo. “Se trabalharmos a conscientização junto aos produtores e soubermos cuidar da água e armazená-la, não vai faltar água para o nosso desenvolvimento futuro”, afirmou.
Indústria: água é uma questão econômica
Encerrando as apresentações, o coordenador da Câmara Técnica da Indústria dos Comitês PCJ e representante do Ciesp/Fiesp, Jorge Mercante, destacou que a indústria desde a década de 1980 está reduzindo as captações, além de melhorar constantemente a qualidade dos efluentes lançados nos corpos d’água. Para ele, o setor terá de rever a possibilidade de adoção de água reuso nos processos industriais, a exemplo do que acontece com o projeto Aquapolo, no polo petroquímico do ABC Paulista.
Mercante pontuou que a alternativa mais econômica na questão da racionalização é a educação ambiental, seguida de reservação de água, depois o combate às perdas hídricas e por último, apenas, o reuso. Ele ainda destacou a importância das duas unidades hidrográficas, as Bacias PCJ e do Alto Tietê para a economia de São Paulo e do Brasil. “Nessas duas regiões está 55% PIB do Estado de São Paulo e milhões de empregos. Falar de segurança hídrica é falar de economia, também”, disse.
Ações de aumento da disponibilidade hídrica são urgentes
O secretário executivo do Consórcio PCJ comentou sobre as obras dos reservatórios nas Bacias PCJ, informando que elas fazem parte do Plano de Bacias PCJ, desde 1995 e são três reservatórios e não dois como se tem noticiado: as barragens de Amparo, Pedreira e do Ribeirão Piraí, em Salto, que poderá atender a ampliação do Aeroporto Internacional de Viracopos. “Esses reservatórios precisam ser construídos o quanto antes porque nossa necessidade é urgente”, atentou Lahóz.
O Grupo de Eventos Extremos do Consórcio PCJ deverá se reunir novamente, no mês de maio para discutir sobre novas regras operativas do Sistema Cantareira e a possibilidade de uma renovação de outorga de período mais curto e temporário, aguardando assim a recuperação dos reservatórios para discutir a renovação por um período de tempo maior.